Textículo (*) s. m., texto ridículo; texto pequeno. (* não existe no dicionário)
11.12.09

«Mokhtar sentou-se na esplanada de um café de aspecto sórdido, mas cujo rádio difundia uma melodia da cantora mítica que lhe fazia lembrar Malika, a sua mãe, que não podia ouvir este lamento de um amor perdido sem que os olhos se lhe marejassem de lágrimas.

A esta hora matinal, para além de um jovem adormecido sobre um banco, como um destroço rejeitado pela noite, o local proporcionava uma calma, sem dúvida precária, mas por agora propícia à reflexão.

Evidentemente, não estava nas suas intenções reflectir de novo sobre a perenidade da estupidez humana, nem vituperar os lastimáveis dirigentes deste mundo, pois todos estes indivíduos se encontravam há muito esgotados e não eram merecedores de qualquer outra crítica mais aprofundada. Numa palavra, o que ele desejava de imediato era um recanto tranquilo onde pudesse recordar – antes que perdesse todo o sabor – o incidente burlesco que precipitara o seu despedimento do lugar de professor de uma escola de um bairro popular da cidade costeira, considerada histórica, a que chamam Alexandria.

Tudo começara por uma discussão sem motivo aparente com o director do estabelecimento escolar, um homem pleno de ignorância e, ainda por cima, casado com uma mulher feia. Esta dupla particularidade tornava-o detestável e intolerante nas suas relações com as pessoas inteligentes e solteiras.

Após algumas insinuações pérfidas acerca da concupiscência ligada ao celibato, este gerador de crianças degeneradas acusara-o de ter feito esquecer aos seus alunos, no espaço de alguns meses, o que eles haviam demorado muitos anos a aprender.

Mokhtar, nada surpreendido com este elogio que considerava absolutamente merecido, não pôde resistir à tentação de dar uma estocada definitiva e global na hierarquia, mesmo que esta fosse de medíocre qualidade. Respondeu com um tom de comiseração, como se estivesse a dar os pêsames a um viúvo amargurado, que os seus alunos tinham mesmo assim aprendido uma coisa muito importante para o futuro: que o director desta escola era um burro, e que era preciso substitui-lo por um burro de verdade, certamente mais agradável de contemplar.

Para qualquer espírito livre dos preconceitos seculares de sacralização do homem, era evidente que tratar um humano de burro constituía um insulto para o burro. Mas o director, incapaz de assimilar uma doutrina tão audaciosa, pôs-se a gritar que um louco estava a querer degolá-lo, atraindo com os seus berros uma matilha de salvadores benévolos que agarraram Mokhtar e o atiraram, com as imprecações habituais, para fora da escola.
», raptado a Albert Cossery.

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17.11.09

Mais segundo menos segundo, foi o tempo que passei os olhos pelo ecrã de televisão.

 

Parvoices por parvoíces passei cinco minutos na net e encontrei isto.

 

 

E senti-me logo melhor.

 

 

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11.11.09

Para coroar um fim-de-semana já de si um pouco mortiço, dou por mim envolvido numa situação de trânsito que quase deu para o torto e que não provoquei.

Agora que estou mais calmo passo a explicar, um filho duma leiteira da estrada de Coina achou por bem ultrapassar-me à má-fila e atirarando-me para a berma da estrada, certamente para salvar da forca o bovino progenitor, não contente com façanha põe-se de seguida a andar devagar à minha frente espreitando pelo retrovisor, devido ao peso dos arganéis que lhe pendiam das orelhas mal se via acima do encosto do banco e ainda assim vislumbrou o meu sinal de que deveria um tanto à inteligência. Parou o carro e ameaçou sair, a contragosto lá tive de abrir a porta e preparar-me para dar ou levar, nem me deu tempo de lhe mandar uma laracha à idoneidade maternal, o pendura da viatura agarrou-o pelo braço e convenceu-o a irem-se embora.

 

Afinal havia inteligência naquele automóvel para além da cabeça do motor e isto não é um elogio só para o caso de vires cá ler este post. E agora já estou calmo!

 

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