“Não sei quantas almas tenho/cada momento mudei/continuamente me estranho/nunca me vi nem me acabei/”, confessou o desassossegado Fernando Pessoa. No quotidiano em que somos apenas sonhos uns dos outros, não bastas vezes pesadelos dos quais não conseguimos acordar, sustentamos a realidade absurda em que escolhemos existir. O ser humano, nascido para a felicidade, muito parece fazer para mantê-la afastada de si, talvez tenha medo de se reconhecer nas suas profundezas.
Neste desarvoro constante, vive-se à cata do que o floresce na compulsiva ansiedade, basta-se com o presente e nada lhe traz contentamento. A vida, qual "mulata assanhada/que passa com graça/fazendo pirraça/fingindo inocente/tirando o sossego da gente/", não está aí a enganar quem dela participa, e a construir em campo minado as fundações de um que, possuindo todas as condições para fazer de si mesmo uma obra prima, escolheu sucumbir à lei da inércia. Não há modelos, nada vem pronto-a-vestir, cada indivíduo é chamado a construir seu destino segundo suas próprias escolhas, fazer o seu próprio caminho. Ter liberdade de escolher o que fazer, de se movimentar pelo que é importante, ter essa responsabilidade face a si próprio e aos outros.
É preciso ter tempo, tempo de escutar e de ouvir. O menos desassossegado bardo de Chicoespier(assim lhe chamava um antigo professor) conclui-o, “Nós sabemos quem somos ou o que somos, mas desconhecemos quem podemos vir a ser”