Sorrateiras e porque não traiçoeiras, certas "rajadas de vento" marcam rupturas definitivas de vida e põem a muitos um dilema angustiante: onde estarei quando isto deixar de existir?
A vida expressada nas faces e nos corpos desmancha-se e cai inerte sem voz nem gesto e se o homem medieval compreendia e aceitava a dor como necessária à expiação e libertação da sua alma, o homem moderno tende a esconjurar o sofrimento em doença, pois não encontra nele nenhum significado, além da tortura do próprio corpo e do espírito. O processo de individualização torna o indivíduo cada vez mais restrito a si e mesmo sabendo ser impossível viver na ausência de relações com os outros, busca ser a medida de si próprio e também dos outros, diante da ausência duma "arte de viver", sobra o medo e o tabu que regula até mesmo o discurso, pois falar obriga a pensar na finitude e por decorrência no fim de projectos, na perda daquilo que se já não têm.
Vive com e da dor, transferido a causa e os motivos do sofrimento para algo que está fora do seu controle, de preferência bem distante. Em momentos sombrios que nada dissipam, consciente da catedra e da emoção, justifica-se com o Alfa e Ómega mas não vislumbra o futuro para além do pretérito que o rodeia, pontapeando as alquímias como uma criança uma pedra, até que rasgue o sapato.